Por Rita Foelker
“Tenho um lado espiritual independente de religiões.” Esta é uma das opções do Orkut para o item “religião”, no perfil de seus participantes.
O que a frase diz, num certo sentido, é evidente: que a pessoa, embora creia numa dimensão espiritual de qualquer tipo, não se enquadra nos sistemas de crença consagrados pelas diferentes religiões e doutrinas. Quer dizer que esta pessoa prefere ter a liberdade de selecionar as idéias nas quais acredita, no que tange à natureza transcendente e propósito de sua existência, a aderir a um corpo doutrinário qualquer.
Mas há outra interpretação possível da mesma frase: a de que somos algo com um lado ou parte material, e com um lado ou parte espiritual. Seria correto pensar-se desta forma?
Bem, o Espiritismo é claro ao dizer que o ser humano é composto de três partes: espírito (o elemento inteligente), corpo (sua parte material) e perispírito (o laço fluídico que une os dois primeiros). Isso parece – apenas, parece – confirmar a correção de se falar de um lado ou parte espiritual. Acontece, porém, que temos muito mais do que um “lado” espiritual. De fato, nós somos essencialmente Espíritos imortais, que se projetam na vida material com propósitos evolutivos e que, para tanto, recebem um corpo físico ao qual se ligam pelo seu perispírito.
Não, não temos uma parte ou lado espiritual, porém, somos Espíritos! A inteligência e a sensibilidade são nossas capacidades naturais enquanto seres incorpóreos, e elas se desenvolvem nas múltiplas encarnações, no contato com o mundo físico e com a realidade social.
Somos aprendizes da vida imortal que exercitam suas lições nos desafios impostos pela vida na materialidade, pela necessidade de sobrevivência, pela busca de harmonia consigo mesmo e da melhor convivência com seus semelhantes. E quando a presente existência atingir seu termo, aqui deixaremos nosso organismo físico, partindo com as aquisições invisíveis do sentimento e da razão rumo a novos aprendizados.
Eu gostaria, no entanto, de propor outro significado que enriquece a compreensão de nossa função no mundo, sem contradizer a divisão conceitual do Espiritismo do homem em três partes. Um sentido mais metafórico, porém, nem por isso, menos relevante. Este sentido nos é dado num texto escrito por Leonardo Boff, que diz, entre outras coisas*: "Captar a profundidade do mundo, de si mesmo e de cada coisa constitui o que se chamou de espírito. Espírito não é uma parte do ser humano. É aquele momento da consciência mediante o qual captamos o significado e o valor das coisas. Mais ainda, é aquele estado de consciência pelo qual apreendemos o todo e a nós mesmos como parte e parcela deste todo."
Ou seja, ser Espírito é também uma espécie de experiência possível ou de consciência que se alcança, uma percepção de sermos participantes de uma integração entre leis e forças que sustentam todo o Universo.
Efetivamente, muitos vivem numa escala de prioridades onde a rotina, a corrida pelos bens materiais e a conquista de status social parecem ser os valores primordiais. Ou seja, ser Espírito não implica em automaticamente sentir-se como tal, nem em compreender as conseqüências desta verdade e, muito menos, em viver segundo as necessidades da evolução espiritual.
Mas em algum momento em nossas vidas, tal realidade se revela. E ao nos sentirmos seres espirituais, ao capturarmos pela sensibilidade a ordem perfeita do Cosmos e sua conexão com cada ínfimo Ser, entrando em contato com o invisível subjacente a toda realidade visível, nós conseguimos nos ver como os seres espirituais que realmente somos. Livres dos condicionamentos do tempo e espaço, mudamos nossa escala de prioridades de vida.
Captamos a importância da oportunidade que temos na presente existência, de cada segundo que vivemos, de cada palavra pronunciada, de cada gesto, na construção da nossa melodia no concerto universal da Criação. Captamos a importância dos seres que encontramos no caminho e ganhamos um novo e mais completo sentido para o existir: o existir do Espírito.
* Leonardo Boff, em “Espiritualidade, dimensão esquecida e necessária” – Disponível em http://www.cuidardoser.com.br/espiritualidade-dimensao-esquecida-e-necessaria.htm
Fonte: Site “FEAL – Fundação Espírita André Luiz”
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